segunda-feira, 19 de março de 2012

Direito Processual Civil III: Aula 16/03/12 - Fraude Contra Credores e Frande à Execução.


Fraude contra credores.
(Clóvis Beviláqua) "Fraude, no sentido em que o termo é empregado pelo Código Civil nesta seção, é todo ato prejudicial ao credor (eventus damni), por tornar o devedor insolvente ou ter sido praticado em estado de insolvência.
Não exige o Código o requisito da má fé (consilium fraudis), que, aliás, ordinariamente, se presume, porém que não é essencial para determinar a fraude e tornar anulável o ato.". Concluímos, pois, que o elemento imprescindível para caracterizar a fraude contra credores é o eventus damni, elemento este objetivo. Por seu turno, o elemento subjetivo da fraude é o consilum fraudis, ou seja, a má fé, ou ainda, a consciência deliberada de causar prejuízo aos seus credores.
Art. 106. Os atos de transmissão gratuita de bens, ou remissão de dívida, quando os pratique o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, poderão ser anulados pelos credores quirografários como lesivos dos seus direitos (art. 109).
Parágrafo único. Só os credores, que já o eram ao tempo desses atos, podem pleitear-lhes a anulação.
O artigo em tela visa proteger os credores quirografários (4) não só da transmissão onerosa de bens (art. 107 do CC.) feita pelo devedor insolvente, como também da gratuita (ex.: doação) e da remissão de dívida (perdão) colimando a frustrar seus os interesses.
Dispõe o parágrafo único do art. 106 do CC., ao tratar da legitimidade ativa para a propositura da ação pauliana, conduzente à desconstituição dos contratos efetivados, que "só os credores, que já o eram ao tempo desses atos, podem pleitear-lhes a anulação". Além desse fato, outro requisito para prosperar o pedido de revogação é ser o crédito anterior ao ato tido como fraudulento e praticado pelo devedor.
Humberto Theodoro Júnior diz: "Um dos atributos do direito de propriedade é o poder de disposição assegurado ao titular do domínio. Mas o patrimônio do devedor é garantia geral de seus credores; e, por isso, a disponibilidade só pode ser exercitada até onde não lese a segurança dos credores".
Art. 107. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contraente.
O art. 107, do Código Civil, proclama que, ao lado das hipóteses de transmissão gratuita previstas no art. 106, serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante.
Maria H. Diniz, no tocante a notoriedade da insolvência, nos leciona que: "Será notória a insolvência de certo devedor se for tal estado do conhecimento geral. (...) por exemplo, será notória a insolvência se o devedor tiver seus títulos protestados ou ações judiciais que impliquem a vinculação de seus bens."  Clóvis Beviláqua nos esclarece que: "Para a anulabilidade dos contractos onerosos, não basta a insolvência do devedor; é necessário mais que esse estado seja conhecido da outra parte contratante, por ser notório, ou porque tenha esta motivo de conhecer."
Art. 108. Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço e este for, aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com citação edital de todos os interessados.
Para aclarar o art. supra, recorremos aos ensinamentos do eminente jurista Silvio Rodrigues, que faz alusão a fraude ainda não ultimada: "Se o preço for o corrente e se o comprador que ainda não o pagou deposita-o em juízo, cessa o interesse dos credores, que, por conseguinte, perdem a legitimação ativa para propor a ação pauliana." (Direito Civil, vol. I. São Paulo, Ed. Saraiva, 27ª ed., 1997, p. 234). Outrossim, é o entendimento de Clóvis Beviláqua quando assevera que, nesta hipótese, é manifesta a boa fé do adquirente. Todavia, se o preço da aquisição não for o corrente, pode-se supor que o adquirente agiu com malícia, o que suscitará, por parte dos credores, reclamar a restituição da coisa vendida ou o preço real dela, ao tempo da alienação.
Em última análise, bastante elucidativo é o exemplo dado por Levenhagen em sua respeitável obra (Código Civil – Parte Geral, vol. I. São Paulo, Ed. Atlas, 1985, p. 143), v.g.: " comprador dos bens do insolvente, que ainda não tenha pago o preço, vem a cientificar-se da situação financeira do vendedor. Poderá obstar o ajuizamento da ação pauliana e evitar a anulação do contrato, depositando em juízo a respectiva importância e citando, por edital, todos os credores". Por certo, o edital tem o escopo de facultar a qualquer credor interessado contestar o valor depositado em juízo. Daí defluem duas hipóteses. A primeira; Se constatado que o preço do bem não for o corrente, e sim um preço vil, o Juiz determinará o levantamento do depósito, facultando, assim, a propositura da ação pauliana por parte dos credores. A Segunda, em caso contrário, o contrato não será anulado.
Podemos consubstanciar o acima exposto no princípio da boa fé do adquirente, diferentemente do que pudemos observar nos art. 106 e 107 do CC., pois aí vêm à tona a má fé do adquirente.
Art. 109. A ação, nos casos dos arts. 106 e 107, poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má fé.
A ação que se faz alusão é a ação pauliana ou revocatória, que tem como fito a revogação do ato lesivo aos interesses dos credores, restaurando, com isso, o patrimônio do devedor e, por ilação, a garantia dos credores.
O artigo 109 do aludido diploma legal, está a exigir um litisconsórcio passivo necessário, pois, sem embargo da doutrina em contrário, a fraude contra credores visa, em essência, a anulabilidade do ato, isto é, a desconstituição do próprio negócio impugnado.
Desse modo, apesar de estar incluído o verbo "poder" no artigo 109 do Código Civil ("poderá"), este, afastada a sua interpretação literal, há de ser substituído pelo verbo "dever" ("deverá"), de modo também a se harmonizar - dentro de interpretação lógico-extensiva - ao artigo 47 do CPC, em conformidade com a doutrina do eminente processualista Arruda Alvim (Manual de Direito Processual Civil. São Paulo, Ed. RT, 1995, vol. ll, p. 59), que preconiza estar a impor o litisconsórcio necessário havendo disposição de lei, "quer processual, quer material". Mister se faz o litisconsórcio para a execução da sentença, sendo "conditio sine qua non" também a inclusão do devedor alienante, para que esta possa produzir efeito contra todos os partícipes do ato de disposição do bem.
Ademais, estabelece o art. 109 do CC.: "A ação, nos casos dos arts. 106 e 107, poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé".
De acordo com Washington de Barros Monteiro, "A ação não pode ser ajuizada exclusivamente contra o devedor insolvente, mesmo porque a eventual execução da sentença terá de ser dirigida contra o adquirente, detentor da coisa. Assim, sob pena de nulidade ab initio, deve ser ela promovida não só contra o devedor, como também contra a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta. Se o objeto alienado pelo devedor já foi transmitido a um sub adquirente, deverá ser este igualmente citado; nesse caso, porém, para que vingue a ação contra o último, preciso será que deste se prove má fé".
Art. 110. O credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu.
De pronto, urge salientarmos que, obviamente, não constitui fraude contra credores em se tratando de dívida já vencida, visto que não há má fé por parte do credor. Indubitavelmente, não caberá ação pauliana. Da mesma forma, improcedente será a ação pauliana intentada se o pagamento da dívida for a credor privilegiado, salvo se o pagamento antecipado superar o valor do bem dado em garantia.
O art. em estudo visa garantir, no concurso creditório, a maior igualdade possível entre os credores quirografários (aqueles sem garantias reais). Decerto, estamos aqui fazendo alusão ao fato de que "o pagamento antecipado de dívida frusta aquela igualdade, acima aludida, entre os quirografários" (Direito Civil, vol. I. São Paulo, Ed. Saraiva, 27ª ed., 1997, p. 234). Outrossim, como bem observa Limongi França: "Em tal hipótese, o recipiendário deve repor a quantia que recebeu em proveito do acervo que será objeto do concursum creditorum." (Instituições de Direito Civil, São Paulo, Ed. Saraiva, 4ª. ed., 1996, p. 173).
Em última instância, completamos asseverando que a devolução não será apenas em proveito daqueles que o acionaram, senão em benefício do acervo do devedor, o que se traduz em benefício de todos os credores que legalmente estiverem habilitados no concurso creditório
Art. 111. Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedor insolvente tiver dado a algum credor.
No caso previsto quis o legislador vedar, caracterizada a insolvência do devedor, a possibilidade deste em dar garantias reais de dívidas a determinado credor. Frise-se que tais garantias são as reais. Nesse sentido, pouco importa tratar-se de dívida vencida ou não, pois, o que se quer é justamente pôr a salvo a igualdade entre os credores. Não se pode olvidar, por óbvio, que "Se tal garantia for dada antes da insolvência do devedor, não há que se falar em fraude contra credores." (Código Civil anotado. São Paulo, Ed. Saraiva, 3ª. ed., 1997, p. 131).
Consentâneo ressaltarmos que o credor quirografário beneficiado com a outorga de garantia real e, portanto, elevado a grau privilegiado ante aos demais credores, perde unicamente "a preferência concedida a um dos credores e não o crédito do qual é titular." (Direito Civil, vol. I. São Paulo, Ed. Saraiva, 27ª ed., 1997, p. 235). Destarte, continua ele, como credor, retornando à condição de quirografário.
          Art. 112. Presumem-se porém, de boa fé, e valem, os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, agrícola, ou industrial do devedor.
O célebre jurista A. J. de Souza Levenhagen nos esclarece que: "A presunção prevista no artigo em epígrafe justifica-se porque visa preservar o patrimônio do insolvente, o que, em última análise, redunda em benefício dos credores." (Código Civil – Parte Geral, vol. I. São Paulo, Ed. Atlas, 1985, p. 145).
Abstrai-se deste enunciado o intuito do devedor em garantir o funcionamento do seu estabelecimento mercantil, agrícola, ou industrial e, consequentemente evitar o agravamento de seu já prejudicado estado de insolvência. Surge aí a seguinte questão: Pode o devedor insolvente contrair novos débitos mediante garantia real dada ao novo credor? Nossa resposta encontra-se sob a égide do eminente jurisconsulto Silvio Rodrigues: "Tanto isso é verdade que, se tais atos forem de caráter ordinário e indispensáveis à manutenção do estabelecimento mercantil, agrícola, ou industrial do devedor, a lei não impede que este último atue amplamente na órbita do direito, alienando e onerando bens." (Direito Civil, vol. I. São Paulo, Ed. Saraiva, 27ª ed., 1997, p. 235).
Relevante, também, a observação do mestre Limongi França quando destaca a presunção de boa fé. Todavia, a aludida presunção "admite prova em contrário, pois tal pode ser, verbi gratia, a alienação simulada do estoque de uma loja, que o seu caráter fraudulento não se pode negar." (Instituições de Direito Civil, São Paulo, Ed. Saraiva, 4ª. ed., 1996, p. 174). O que se quis ponderar foi justamente a possibilidade do novo credor (fornecedor), em conluio fraudulento com o devedor (consilium fraudis), emitir nota fiscal de, por exemplo, R$100 mil e, na verdade, entregar apenas o equivalente a R$30 mil. Obviamente que a diferença (R$70 mil) constituir-se-á desvio em prejuízo dos demais credores quirografários.
          Art. 113. Anulados os atos fraudulentos a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores.
Parágrafo único. Se os atos revogados tinham por único objeto atribuir direitos preferenciais, mediante hipoteca, anticrese ou penhor, sua nulidade importará somente na anulação da preferência ajustada.
O art. em questão vem consubstanciar o que a pouco já dissemos, ou seja, "os bens alienados voltam ao patrimônio do devedor; as garantias concedidas se aniquilam; e os pagamentos antecipados são devolvidos." 
Em análise ao parágrafo único, observa-se que uma vez anuladas as garantias reais, restabelece-se entre os credores a igualdade que a fraude procurava desfazer.
Ação Pauliana.
O objetivo precípuo da ação revocatória ou pauliana (de origem romana, introduzida pelo pretor Paulo, e daí o seu nome) não é outro senão anular o defeito do ato jurídico, neste ensaio perquirido.
Como nos ensina o eminente jurista Carlos Roberto Gonçalves, com fulcro no art. 106, parágrafo único do CC., "Só estão legitimados a ajuizá-la (legitimação ativa) os credores quirografários e que já o eram ao tempo da alienação fraudulenta. (...) Os credores com garantia real não podem ajuizá-la porque já existe um bem determinado, especialmente afetado à solução da dívida". Cumpre-nos lembrar que, no caso dos credores preferenciais, uma vez verificada a insuficiência do bem dado em garantia para a satisfação do crédito, podem demandar através da ação pauliana.
No que tange a legitimação passiva (art. 109 do CC.) é certo que a ação deve ser intentada não só contra o devedor como também contra aquele que com ele celebrou a estipulação fraudatária, bem como contra terceiros adquirentes que tenham agido de má fé. Ademais, o ilustre jurisconsulto Cândido R. Dinamarco, também, com acuidade peculiar, pondera fazer sentido o litisconsórcio necessário passivo na ação pauliana "para os que afirmam que a fraude contra credores torna anulável o ato: é que, com a anulação, o próprio ato se desfaz e as partes e bens se restituem ao estado anterior (art. 158 do CC.), o que realmente significa alteração jurídica do alienante e não só do adquirente".
Impende salientar, a princípio, que são em número de três os requisitos para a propositura da ação pauliana: a) a anterioridade do crédito; b) o consilium fraudis (má fé) e c) o eventus damni (insolvência do devedor). Não obstante, sustentam alguns doutrinadores que a propositura da ação pauliana dispensa a intenção precisa e determinada de prejudicar (má-fé), bastando a consciência da insolvência para a caracterização da fraude.
No concernente a anterioridade do crédito, um dos requisitos da ação pauliana, "determina-se pela causa que lhe dá origem. Assim, para que um crédito seja considerado anterior ao ato fraudulento, deve surgir antes da realização deste, não se confundindo com a sentença que apenas o reconhece e o declara. Ademais, é inexigível, para a configuração da anterioridade do crédito, que a sentença condenatória transite em julgado, já que em casos de ato ilícito, tal direito surge no momento do ato considerado lesivo que origina a ação de indenização."
Fraude à execução.
A fraude de execução é instituto de direito processual previsto no Livro II, Título I, Capítulo IV do Código de Processo Civil sob o título "Da Responsabilidade Patrimonial" (artigo 593, I a III), que não se confunde, ainda que em muitos pontos coincida, com a fraude contra credores, que pertence ao direito material (artigos 158 e 159 do Código Civil de 2002). Revela-se a primeira mediante dados puramente objetivos, caracterizados pela insolvência e pela pendência de um processo, irrelevante a existência ou não do consilium fraudis. No entanto, apesar de caracterizar o ato fraude a credores, na medida em que a eficácia do ato fraudulento frustraria as expectativas dos mesmos, aniquilando a garantia geral dos débitos, representada pelo patrimônio do devedor, a fraude de execução constitui ato de maior gravidade, porque além de ser mais evidente o intuito de lesar os credores, nas palavras de Enrico Tulio Liebman, apud Humberto Theodoro Junior, "a alienação dos bens do devedor vem constituir verdadeiro atentado contra o eficaz desenvolvimento da função jurisdicional já em curso, porque lhe subtrai o objeto sobre o qual a execução deverá recair" 
Sabemos que um dos atributos do direito de propriedade é a disponibilidade dos bens pelo titular. Mas, o devedor responde por suas obrigações com os bens que integram seu patrimônio (presentes e futuros). É o que expressa o artigo 591 do Código de Processo Civil: "o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei".
Observa, a propósito, Pontes de Miranda, que o patrimônio de uma pessoa está sempre in fieri - isto é, modificando-se continuamente, por acréscimo ou diminuição de bens e frutos. Pode ocorrer, contudo, que estes atos de disposição, decorrentes do próprio direito de propriedade (observe-se que o artigo 591 do Código de Processo Civil não estatui obrigação de "congelamento" patrimonial), ao invés de constituírem-se em alterações normais, revelem intuito fraudulento.
Ocorrendo a alteração anormal do patrimônio do devedor na pendência de uma relação processual, patente que a fraude adquire expressiva gravidade, já que o eventual negócio jurídico não agride somente ao círculo potencial de credores, mas, atinge, agora, a própria efetividade da atividade jurisdicional do Estado. Estes atos de alienação e oneração perpetrados pelo devedor, quando pendente um processo, são denominados fraude de execução (presumindo a lei a redução total ou parcial da garantia).

Nesta espécie de fraude, segundo o entendimento uniforme da doutrina brasileira, os atos inquinados de fraudulentos, ainda que gerem pleno efeito entre alienante e adquirente, são considerados ineficazes frente ao exeqüente, a quem não podem ser opostos. Desta forma, a força da execução poderá atingir o objeto da alienação ou oneração fraudulenta, como se não tivessem ocorrido, ainda que em prejuízo de terceiro adquirente, que só poderá socorrer-se dos embargos de terceiro.
Caracteriza-se a fraude de execução pelos seguintes requisitos: a) processo pendente (litispendência); b) atos de alienação ou oneração dos bens do devedor com intuito de frustrar os meios executórios.
Consoante os artigos 263 e 219 do Código de Processo Civil, aplicáveis tanto ao processo de conhecimento quanto à execução, a litispendência instala-se com a citação, retraído tal efeito ao momento da propositura. Desta forma, as alienações efetuadas pelo devedor antes da citação, em princípio, não podem ser consideradas atentatórias à dignidade da Justiça. No entanto, não é rigorosamente indispensável a citação. Se o devedor inequivocamente tinha ciência da ação proposta, então, ainda que não citado, o ato de alienação ou oneração realizado após o ajuizamento é inquinado como fraudulento. Atos de alienação envolvem toda transferência de bens seja a título oneroso ou gratuito, alcançando a citada norma os processos simulados.
Quanto à oneração, refere-se a lei a direitos reais de garantia (penhor, hipoteca, anticrese) e os direitos sobre coisa alheia (usufruto, habitação). No entanto, certos atos, ainda que não enquadrados na figura da alienação ou oneração, podem igualmente representar fraude à execução. Exemplos: dação em pagamento, renúncia à herança, partilha de bens em separação consensual, etc.
Nestes termos, a indicação do artigo 593, caput seria apenas exemplificativa.
Desnecessária para a caracterização de fraude contra a execução a presença do consilium fraudis. Não é caso de presunção legal de fraude bilateral, mas de total dispensa dela.
A litispendência de ação real impede a alienação ou gravame da coisa litigiosa, que se há de considerar ineficaz por fraude à execução - ineficácia relativa, pois só existe a respeito das pessoas que figuram no litígio. No entanto, seus efeitos podem vir a atingir direitos de terceiros. Expõe Cândido Rangel Dinamarco:
"Se a ação que pendia contra o alienante for fundada em direito real de propriedade (v.g., ação reivindicatória ou de usucapião) e vier a ser julgada procedente, dono será, e como tal declarado em sentença, o autor da demanda e não o adquirente" (p. 280). 
O artigo 593, II, inquina de fraude à execução os atos de alienação ou oneração de bens quando, ao seu tempo, "corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência".
Além das ações condenatórias, outras ações, penais ou civis, constitutivas (como separação ou divórcio), declaratórias, executivas ou mandamentais, ensejam o resultado coibido pelo instituto. A insolvência, na dicção do artigo 748 do Código de Processo Civil, surge evidente "toda vez que as dívidas excederem à importância dos bens do devedor", não se exigindo prova cumprida e cabal para caracterizar a fraude, não se impondo tampouco sua formal declaração, isto porque o artigo 593, inciso II, incide particularmente em execuções singulares. Desta forma, para fins de fraude contra o processo executivo, a cognição judicial no exame da insolvência é sumária e ocorre no próprio processo em que se materializa a denúncia do credor. Compete ao executado o ônus de demonstrar a titularidade de outros bens móveis ou imóveis, situados fora do juízo da execução. É claro que afastada a insolvência não se pode falar em fraude.
Araken de Assis observa que, apesar de ausente dos incisos do artigo 593 do Código de Processo Civil, a alienação ou a oneração de bens objeto de penhora ou arresto também se afigura ineficaz.
A penhora não traz a indisponibilidade dos bens apreendidos, inexistindo qualquer razão jurídica ou legal para que a penhora impeça a alienação do bem penhorado. No entanto, a penhora torna ineficaz, perante o processo, qualquer ato de disposição praticado pelo devedor que desrespeite a constrição.
Ressalta Cândido Rangel Dinamarco que "a alienação do bem penhorado constitui forma particularmente grave de fraude de execução, em que até mesmo se dispensa o requisito da insolvência do alienante", caracterizando verdadeiro "atentado ao estado de concreta sujeição do bem e não apenas tentativa de subtrair bem responsável e ainda não constrito".
Salutar a nova alteração introduzida pela Lei 10.444, de 7 de maio de 2002, sob dicção do § 4º do artigo 659 do Código de Processo Civil ("A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo ao exeqüente, sem prejuízo da imediata intimação do executado (art. 669), providenciar, para presunção absoluta de conhecimento por terceiros, o respectivo registro no ofício imobiliário, mediante apresentação de certidão de inteiro teor do ato e independentemente de mandado judicial") que, além de prevenir demandas mediante alegação de fraude de execução, busca preservar terceiro adquirente, encontrando precedente no Código de Processo Civil português, mais precisamente em seu artigo 838 - efetivação da penhora de imóveis - nº 3, verbis: 
"Em relação a terceiros, a penhora só produz efeitos desde a data do registro, o qual terá por base uma certidão do respectivo termo. Ao processo juntar-se-á certificado do registro e certidão dos ônus que incidam sobre os bens abrangidos pela penhora" (Reforma do Código de Processo Civil, coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira).
Mediante breve anotação de entendimento pessoal no sentido de que o registro não figura como requisito de validade da penhora, impende observar, no que diz com a obrigatoriedade do registro, que, antes do advento da Lei 8.953/94 e agora da Lei 10.444/02, predominava a tese de que a fraude na venda de bem imóvel onerado independia da referida providência, surgindo tão-só da materialização do ato executivo, do qual deriva toda a publicidade necessária.
Se a penhora recair sobre bem imóvel, portanto, é obrigatório seu registro no Cartório Imobiliário respectivo, nos termos do artigo 659, § 4º do C.P.C., não se configurando a fraude de execução antes dessa providência, salvo demonstração a cargo do credor-exeqüente de pleno conhecimento por parte do adquirente, então terceiro de má-fé. É o entendimento de Araken de Assis e do STJ. Anota, a propósito, Humberto Theodoro Junior que "não se configurará a fraude sem tal ato de publicidade senão provando a má-fé do terceiro adquirente (i. e., sua ciência do gravame)" (p. 211).
A lei não desprezou hipóteses outras, como a transferência da impenhorabilidade da residência familiar, estabelecendo o artigo 4º, caput, da Lei 8.009/90, nova hipótese de fraude à execução (art. 593, III): "Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga". Consoante dicção do artigo 5º, parágrafo único, da citada lei, a impenhorabilidade da residência familiar recairá sobre o imóvel de menor valia, a moradia "mais valiosa" se exporá à desapropriação em execução singular ou coletiva (concurso).
Se o devedor tiver se desfeito da moradia antiga o ato judicial que "anular" a alienação atingirá o adquirente. No entanto, aponta Araken de Assis outra alternativa que considera mais vantajosa: simples eliminação da impenhorabilidade da nova moradia. De qualquer forma, o citado autor observa que compete ao credor, que almeja penhorar a residência mais valiosa, provar a insolvência e a má-fé do devedor.
A declaração de existência de fraude à execução ocorre, incidenter tantum, no próprio processo executivo. Dependerá de postulação do credor. No entanto, nada impede que seja reconhecida de ofício pelo juiz (conforme Cândido Rangel Dinamarco e Yussef Said Cahali).
O pronunciamento do juiz constitui decisão e portanto é agravável.
Embora íntegra proteção emprestada ao credor-exeqüente contra eventual fraude que tenha por objetivo esvaziar o patrimônio de devedor que algumas vezes, habilmente, aponta ausência de bens passíveis de garantir a execução, preservado com anterior registro da constrição o ato de transmissão envolvendo terceiro de boa-fé. Sem dúvida, não parece fácil a prática que encanta alguns devedores.








http://jus.com.br/revista/texto/643/fraude-contra-credores/
http://www.professoramorim.com.br/amorim/texto.asp?id=21

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